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Crítica | Antes Que Eu Me Esqueça

Com premissa interessante, o filme acaba não explorando todo seu potencial dramático por problemas na construção de relações entre personagens


Representar a condição humana frente às adversidades, independente da natureza destas, é tarefa árdua. A pluralidade de comportamentos humanos em resposta à essas situações de adversidade faz com que os roteiros cinematográficos precisem trabalhar de forma muito convincente o desenvolvimento das relações de seus personagens entre si e com o meio, sob pena de desperdiçar uma boa ideia narrativa. E esse é, infelizmente, o maior pecado de "Antes Que Eu Me Esqueça"

O filme escrito por Luisa Parnes e dirigido por Tiago Arakilian conta a história de Polidoro (em uma belíssima interpretação de José de Abreu), um juiz aposentado que começa a apresentar sintomas de alzheimer, e sua família durante um processo para interdição do idoso. Quem da início a este processo é sua filha Bia (interpretada por Letícia Isnard), que é mais próxima do pai, e Paulo (vivido por Danton Mello) acaba se tornando peça fundamental para que o juiz decida sobre a interdição de Polidoro, uma vez que pai e filho estão afastados faz muito tempo e desconhecem da vida um do outro.

Pela premissa fica evidente que a relação entre Polidoro e Paulo é fundamental para a carga dramática da história; e para construir isso o roteiro opta por desenvolver individualmente os dois personagens, apresentando suas angústias, anseios e relações.

A construção do juiz faz uso de elementos humorísticos inusitados ligados à exploração da sexualidade, quase que como um respeitoso flerte às pornochanchadas. Polidoro primeiramente demonstra ser um "velho tarado" que deseja ser dono de uma casa de entretenimento adulto na zona sul do Rio de Janeiro. Nesse estabelecimento conhecemos Alceu e Joelma (Eucir de Souza e Guta Stresser, respectivamente), personagens secundários que ajudam a mostrar a humanidade de Polidoro enquanto este passa a demonstrar carinho e afeto pelos funcionários e amigos que frequentam a "Polygamus". Entre esses amigos, inclusive, há breves participações de Dedé Santana em meio ao grupo de idosos, como uma referência ao humor brasileiro mais tradicional.

Já Paulo demonstra sua frustração no ramo da música, as dificuldades em lidar com a morte de sua mãe, problemas em relacionamentos amorosos... E como apoio disso tudo temos David (Augusto Madeira) e a procuradora Maria Pia (Mariana Lima), sendo que a última ganha um pequeno desenvolvimento quanto sua liberdade sexual e estilo de vida sério. Comparativamente ao arco de Polidoro, o de Paulo é tenta ser mais emotivo e menos engraçado, enquanto o de Maria Pia tem como destaque uma cena cômica em que ela e Joelma falam sobre a vida sexual da procuradora.

Infelizmente os desenvolvimentos de pai e filho passam muito tempo distantes. Quando o caminho dos dois finalmente se encontra o filme já caminha para o ápice dramático do filme, que de fato é muito emocionante graças, principalmente às ótimas atuações de José de Abreu e Danton Mello. Ainda assim fica o sentimento de que a relação dos dois poderia ser melhor desenvolvida e então a carga dramática construída teria ainda mais peso. Além disso, a relação entre Paulo e Maria Pia também poderia ser melhor trabalhada para dar mais humanidade aos personagens.

A direção do longa é comedida, deixando o destaque para as atuações, tendo algumas sequências interessantes e de beleza visual louvável, aliando-se com a fotografia competente do filme que trabalha bem as cores para marcar os momentos de comédia e os de drama. É, portanto, uma competente obra que infelizmente entrega menos do que poderia.

NOTA: 6,5

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